Por Plínio Rocha
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Um passo para trás hoje para dar dois passos para frente amanhã.

Não é necessário dizer que não deve ter sido fácil para Cesar Cielo abandonar o Mundial de Kazan. Não seria para ninguém. O cara não chega lá automaticamente. Sofre para isso. Passa por um inferno na Terra antes e para se classificar.

Mas certas decisões precisam ser tomadas. Não adianta brigar por alguma coisa maior, e se a lesão que ele sentiu e acusou está lá, foi a coisa certa a se fazer. Até para evitar que se agravasse e comprometesse outros objetivos futuros.

Quando um cara como Cielo tem uma atitude dessas, mil teorias são imediatamente levantadas. Todo mundo encontra uma maneira pessoal de avaliar o que aconteceu. Ninguém, no entanto, além dele, saberá exatamente como ele está se sentindo. Talvez nem mesmo as pessoas mais próximas.

Olhando as entrevistas recentes do nadador, percebia-se outra coisa. A lesão é invisível aos olhos, mas as palavras que ele vinha soltando batiam com tanta força no ouvido que era quase possível materializá-las.

Cielo está com o ombro machucado, e nenhum atleta que faz o que ele faz consegue ter ótimo rendimento dessa maneira. Mas não era apenas isso. Cesar estava com uma coisa fora do lugar, talvez uma das coisas mais importantes na carreira dele: a cabeça.

Cielo não estava confiante. Não estava tranquilo para fazer o que tinha de fazer. Em função da dor, do problema físico, da preparação comprometida? Não se sabe. Nem interessa. Uma parte importante dele estava fora de compasso.

Cesar sempre foi o tipo do cara que ganhou as provas antes mesmo de elas começarem. A confiança dele não atingia apenas a ele. Intimidava quem estava ao lado. Na sala de aquecimento, aquela encarada, vista como besteira por alguns, já deixava claro que ele estava mostrando aos rivais que iria vencer.

Na baliza, o olhar focado era mais uma arma. As entrevistas antes e depois das provas, mais uma. Quando você vê seu adversário dizendo que está se sentindo bem, que está na melhor forma da vida, que está obcecado para conquistar a medalha de ouro, você sente o baque. Não tem jeito. Ainda mais vindo de um cara como ele, que já provou o que pode fazer quando tudo está 100% alinhado.

Não foi o caso. Desde o começo, todo mundo sabia que ele não estava assim, desta vez. Depois dos 50m borboleta, deixou ainda mais claro.

A cabeça de Cielo, na verdade, estava, sim, em sintonia com o corpo. “Mente sã, corpo são”, dizem? Pois bem… Mente em dúvida, corpo debilitado…

Mas o cara tem crédito. Já esteve nessa situação e mudou o jogo. Já esteve por baixo e deu a volta por cima, inclusive quando muita gente não acreditava. O tri mundial dos 50m livre, em Barcelona-2013, foi um grande exemplo disso. E quando ele começou? No bi mundial dos 50m borboleta, que, além da medalha, deu a confiança que ele precisava para nadar a prova seguinte.

E dá para citar mais alguns exemplos aqui, como em Pequim-2008, quando ele deixa claro que o título dos 50m livre começou no bronze dos 100m.

Mas não é o caso. Não é o momento de apontar e justificar. A decisão está tomada e, certamente, Cielo pesou tudo o que estava em jogo para fazer o que fez.

Um passo para trás hoje para dar dois passos para frente amanhã. É isso. Só isso.

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Plínio Rocha é editor do Diário de S.Paulo e escreve a coluna Na Raia na Best Swimming desde 2007

3 respostas
  1. sergio
    sergio says:

    Exatamente. O ano todo foi ruim!! Eu que acompanho natação sempre me surpreendia por saber que ele estava treinando no Minas, em São Paulo, em uma universidade do deserto dos Estados Unidos, ou, de repente, ele estava treinando por um período na Holanda…É muita mudança. E não, não está dando certo. A saída cada vez pior, a chegada cada vez mais deslizada…

    Quando alguém disser a verdade dura, as coisas como elas são, por exemplo, que o Matheus Santana não melhorou absolutamente nada neste último ano com relação ao último, eu agradeço. Menos propaganda e mais cabeça!

  2. swammer
    swammer says:

    Interessante esses pontos. Nao vou entrar no merito de sair da competicao. Ja saiu. Se ele esta machucado, tem que sair mesmo.

    Mas realmente a temporada foi ruim. Eu ja vinha assustado de como ele nao estava bem ao decorrer da temporada. Eu sempre critiquei tambem a mudanca de equipe dele. Alias, a constante mudanca de treinadores nos ultimos anos. Nao sei se isso causou uma temporada ruim, mas tambem parece nao ter ajudado muito.

    Uma coisa eu acho que nunca vai ser igual….a parceria que ele tinha com o Brett Hawke. Sem duvida o apice da carreira.

  3. Márcio S
    Márcio S says:

    Já deu pra ver desde o Open Da França que ele não estava bem. Quem acompanha a carreira do Cielo sabe que dependendo dos tempos obtidos no final do específico já dá para ter uma ideia do que sairia na competição alvo.

    Em Pequim lembro que ele nadou os 50 livre muito bem em uma competição anterior, dando ideia de que ele mandaria nas Olimpíadas.

    Em 2012 deu pra ver que a travada que ele deu nos 100 comprometeram seus 50. Ele estava rápido demais e na minha opinião tinha condições físicas de ganhar a prova, mas mais uma vez acho que a cabeça deu uma baqueada.

    No mundial após o julgamento do dopping, ele tinha tudo pra ir mal, estava abatido, sendo vaiado, e sua vitória nos 50 borbo deram um ânimo bom.

    Neste mundial a lesão pode ter atrapalhado? sim! Mas o que veio atrapalhando realmente foi sua cabeça. Seu resultado na França mostrou que ele treinou errado neste ciclo e não rendeu o esperado, O específico e o polimento não encaixaram.

    É nítido que o Cielo precisa mudar sua equipe de treinamento novamente. Será que ele não percebeu que enquanto estava em Minas ele estava mandando tempos ótimos? Minha opinião é que ele volte a treinar com quem ele rendeu bem o mais rápido possível.

    Em time que está ganhando nãos e mexe, e as Olimpíadas começam em exatamente UM ANO!

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