Há exatamente um ano, o Brasil alcançava um feito inédito na história da natação. No encerramento, e literalmente no encerramento, o Brasil conquistava o título no quadro de medalhas do Campeonato Mundial de Piscina Curta em Doha, no Catar.
Foi somente no revezamento que fechou a competição, o 4×100 medley masculino, onde o Brasil nadando na raia 1 surpreendeu a todos levando o ouro que fechava a inacreditável conta de sete medalhas de ouro, mais uma prata e dois bronzes, dez medalhas, nossa melhor performance.
A Hungria foi quem mais próximo chegou e era a favorita para levar o título, mas o 7 de dezembro de 2014 foi muito brasileiro. Até então, o Brasil tinha três medalhas de ouro, neste dia mágico, foram quatro.
Tudo começou na prova dos 100 livre. Cesar Cielo havia tomado um “caldo” de Florent Manaudou nos 50 livre e o francês era o franco favorito. Manaudou turbinado por performances espetaculares com recordes mundiais nos 50 livre e 50 costas foi com tudo. Nadou os 100 não só para vencer, mas para quebrar o recorde mundial de 44.94 imbatível desde 2008 do compatriota Amaury Leveaux. Passou forte, 21.62, mas forçou demais e não conseguiu fechar a prova. Cielo nadou de forma inteligente e progressivo, passou atrás com 21.93 e fechou melhor 23.82 contra 24.19. Resultado final, Cielo campeão 45.75, seis centésimos a frente de Manaudou.
A próxima conquista do Brasil foi histórica. Etiene Medeiros se tornou a primeira nadadora brasileira medalhista em Mundiais, mas fez de forma ainda mais brilhante. Subiu no degrau mais alto do pódio e ainda abrilhantado com um novo recorde mundial da prova vencendo com 25.67. Caía mais um recorde da era dos trajes, os 25.70 de Sanja Jovanovic de 2009.
Não dava para respirar, ainda tinha os 50 peito de Felipe França, sua principal prova e para quem já havia ganho os 100, era o franco favorito. Felipe estava bem, e não deu chances, dominando a prova desde o princípio para vencer com 25.63, novo recorde de campeonato.
Brasil agora caminhava para um honroso e significativo segundo lugar. A Hungria estava a caminho do título. Já tinha seis ouros e Katinka Hosszu nadava os 200 livre. Ao Brasil, restava apenas o 4×100 medley masculino, prova em que classificamos com o quinto tempo, quem sabe uma medalha, diriam os experts.
Deu tudo errado para os húngaros, tudo certo para o Brasil. Nem foi preciso torcer contra a Dama de Ferro, a sueca Sarah Sjoestroem depois de ficar 150 metros atrás detonou quebrando o recorde mundial dos 200 metros nado livre com 1:50.78, quatro décimos a frente de Katinka Hosszu. A Hungria terminava com seis ouros, mesmo número que o Brasil, mas nos batia nas pratas.
Ninguém, mas ninguém mesmo esperava que o Brasil fechasse com chave de ouro, literalmente o Mundial de Doha. Guilherme Guido abriu em terceiro com 50.11, melhor do que havia feito na prova (50.21) quando terminou em quinto lugar.
Com Felipe França na água, esperávamos tirar uma diferença que não aconteceu. Nadou para 56.73 e manteve o mesmo terceiro lugar. Pulava Marcos Macedo no borboleta e nadando para 49.63 entregou em quarto. Um quarto lugar mas muito próximo dos três primeiros.
Quando Cesar Cielo pulou na água, os Estados Unidos fechando com Ryan Lochte estavam 85 centésimos a frente do Brasil, a Grã-Bretanha fechando com Ben Proud 66 centésimos e a França de Clement Mignon apenas cinco centésimos.
Cielo saiu forte, muito forte, 21.15 nos primeiros 50 metros. Na prova dos 100 livre, onde foi o campeão no mesmo dia o parcial foi de 21.93. Na altura dos 75 metros, só restava um a sua frente, o americano Ryan Lochte que foi passado no final. Brasil campeão 3:21.14, Estados Unidos 3:31.49 em segundo e a França 3:22.26 em terceiro.
O título de campeão no quadro de medalhas foi muito comemorado. Foi destaque na imprensa nacional e internacional. Ninguém ligou para a contagem de pontos que a FINA deu o troféu de vencedor aos Estados Unidos com 849 pontos. O Brasil foi quarto colocado com 505.
Passado um ano, a natação brasileira está a véspera do início da sua primeira seletiva olímpica. A principal pergunta que se fazia a época da conquista era que impacto isso tudo teria na natação brasileira e, principalmente, para os Jogos Olímpicos do Rio 2016.
A maior alegria da natação brasileira quase virou pesadelo quando em janeiro foi anunciado o caso de doping do nadador João Luiz Gomes Jr. Integrante dos revezamentos que nadaram nas eliminatórias, inclusive o 4×100 medley de ouro que fechou a campanha do Mundial. João testou positivo para um diurético, que segundo sua defesa, foi ingerido de forma involuntária por contaminação em uma farmácia de manipulação.
O Brasil ganhou o título na água e fora dela. João Gomes foi suspenso por seis meses, a punição usual para tal tipo de infração por diurético, mas os resultados dos revezamentos não foram afetados.
Desde então, o Brasil teve uma campanha memorável nos Jogos Pan Americanos de Toronto, recorde de medalhas, de vitórias e um ouro inédito da natação feminina brasileira nos 100 costas com Etiene Medeiros, sempre ela fazendo história.
A campanha do Mundial de Kazan foi mais modesta. Foram quatro medalhas, duas delas em provas olímpicas. Pratas com Thiago Pereira nos 200 medley , Etiene Medeiros nos 50 costas e Nicholas Santos nos 50 borboleta, mais um bronze com Bruno Fratus nos 50 livre.
Foi pouco a relação da conquista de Doha para o avanço do Brasil no ranking mundial das provas olímpicas. Terminamos 2014 com sete nadadores relacionados no Top 10 do mundo, dois deles no Top 3:
Cesar Cielo 2o nos 50 livre, Bruno Fratus 3o nos 50 livre, Cesar Cielo 6o nos 100 livre, Matheus Santana em 8o nos 100 livre, Felipe França em 10o nos 100 peito, Leonardo de Deus em 6o nos 200 borboleta e Thiago Pereira em 5o nos 200 medley.
Este ano, ainda faltando a disputa do Open, o Brasil tem oito nadadores no Top 10 do mundo, mas nenhum no Top 3:
Bruno Fratus 4o nos 50 livre, Cesar Cielo 7o nos 100 livre, Marcelo Chierighini 10o nos 100 livre, Guilherme Guido 9o nos 100 costas, Felipe França 5o nos 100 peito, Thiago Pereira 4o nos 200 medley, Henrique Rodrigues 7o nos 200 medley e a novidade, Etiene Medeiros em 10o nos 50 livre.
A inclusão de uma mulher no Top 10, sem dúvida, foi um grande avanço, mas mais avanços mesmo se viu na performance dos revezamentos.
Em 2014, tivemos apenas um revezamento, o 4×100 livre ranqueado entre os 10 do mundo, ocupando a sétima posição.
Este ano, são cinco revezamentos no Top 10. Todos masculinos, 4o no 4×100 livre, 9o no 4×200 livre e 8o no 4×100 medley, e novamente, um grande avanço no feminino, 7o no 4×100 livre e 10o no 4×200 livre.
De olho no Rio 2016, e na busca de medalhas, a conquista do Mundial de Doha foi histórica e memorável, porém mesmo sendo inesquecível, sabemos que ainda há muita água para ser nadada até os Jogos.
Pra gente ver como a piscina curta não serve de base para o “mundo real” da piscina olímpica!