Prá começar, não tenho carro da marca Nissan, nem conta no Bradesco, nunca utilizei um tênis da 361o, ah tá bom, na Coca Cola me pegaram, não resisto a uma diet. Também não fui chamado para carregar a tocha, nem pelos patrocinadores acima listados, nem pelo SporTV, nem pelo COB.

Assim, me sinto muito a vontade, mas muito mesmo, para dizer que vou ao revés nesta campanha de desmoralizar e desprestigiar o revezamento da tocha olímpica Rio 2016. Para mim, o revezamento da tocha é um sucesso.

Não estou ironizando, de forma alguma. Acho que as pessoas perderam um pouco do senso comum onde é muito fácil criticar, depois vem uma compartilhada, mais algumas dezenas de curtidas e aí já temos um protesto.

As pessoas ainda não entenderam o que é o espírito olímpico. Até mesmo os atletas e ex-atletas olímpicos no Dia Olímpico, celebrado recentemente ao redor do mundo no dia 23 de junho. Muitos postaram fotos de suas medalhas, outros no pódio, outros em suas competições. Nada disso! O Dia Olímpico é um momento de celebração do esporte, da confraternização dos povos, do incentivo a prática esportiva. O Dia Olímpico não é para Michael Phelps, Katie Ledecky, Thiago Pereira ou Katinka Hosszu. É para toda a população, meus pais, tios, avós, todos que se mantenham em forma, praticando o esporte, celebrando a vida.

O revezamento da tocha é a mesma coisa. A competição olímpica começa no dia 5 de agosto, até lá, a tocha é de todos nós. O que se faz com a tocha olímpica rodando o país é levando a mensagem por todo o território, os 27 estados, mais de 300 cidades. É para levar a alegria, a promoção e o espírito dos Jogos a todo país.

As pessoas precisam saber que o simbolismo, que para muitos virou comercial, vem da Grécia Antiga, onde o fogo era um elemento divino e piras em chamas eram mantidas a frente dos principais templos indicando perpetuação dos Deuses. A tocha chegou aos Jogos Olímpicos em 1928, mas foi com Adolf Hitler, quem diria, que passou a percorrer o chamado revezamento da tocha até adentrar ao Estádio de Berlim na abertura dos Jogos de 1936.

A tocha que percorre o nosso país é a perpetuação deste movimento, que pertence a toda população, não só da nação que recebe os Jogos, mas de todos os povos do planeta.

Foi bem interessante o movimento feito pela professora Katia Rubio, autora do livro Atletas Olímpicos Brasileiros, para a participação de todos os ex-atletas olímpicos no revezamento. Só fica sem sentido exigir que a organização pague as despesas de viagem para onde quer que eles foram designados. E quem quer levar a tocha para casa como fosse sua. Sem pagar? Quem paga a conta?

A missão do COB não é das mais fáceis. Selecionar 12 mil carregadores, ter representantes de toda população neste revezamento não deve ser nada fácil. Sim, de todos os representantes, pois os Jogos são de todos nós, e não só dos atletas.

Assim, não tem o porque das críticas ao cantor sertanejo, ou o youtuber famoso, a personalidade do Snapchat, o ator global, todos eles, somos nós, o povo brasileiro. É verdade que aconteceram alguns deslizes, alguns até graves. O cantor marginal que está sendo acusado de abuso sexual, desligado a tempo de não tocar na tocha, atleta cumprindo punição por doping, e outros não muito populares, mas por incrível que pareça, isso somos nós, a diversidade brasileira. Até nisso a tocha “suja” nos ajudou.

O episódio da onça foi trágico, mostrou que o exército não deve mais exibir animais em suas apresentações, coisa que até então, era comum. Mas esta “danada” desta tocha nos ensinou que o Exército Brasileiro mantém oito onças e centenas de animais em belas condições depois de recuperá-los nas mãos de caçadores na selva brasileira. Coitada de Simba que foi abatida, mas sem sua história e desta “safada” tocha jamais iríamos saber.

João Reinaldo Costa Lima Neto, o Nikita, foi o primeiro nadador pernambucano a chegar aos Jogos Olímpicos. Depois, como treinador, teve três atletas que chegaram a competição, Adriana Pereira, Joanna Maranhão e Etiene Medeiros. Nikita entrou para história desta “famigerada” tocha por ter sido o primeiro (e único) a cair com ela numa das ruas esburacadas do Recife. Nikita, nem corria, apenas caminhava, sua imagem viralizou, mas mesmo aos 69 anos de idade ele foi forte o suficiente para não soltar a tocha. Caiu feio, mas a tocha ficou na sua mão. Até isso esta “amarga” tocha nos ajudou, mostrou o quanto as ruas do Recife seguem esburacadas.

Esta tocha “não presta”, mas nos motrou que existem políticos tirando proveito de forma incorreta dos Jogos, alguns até pagando atletas para carregá-la.

A tocha é “desprezível”, mas nos ensinou tanta coisa nestes últimos dois meses. Uma delas é de que ainda não somos um país olímpico, muito longe disso. Vivemos uma crise política, econômica, mas principalmente de valores. A intolerância abunda, de norte a sul, de oeste a leste, por todas as cidades em que este “maldito” fogo passou.

É, para mim esta tocha é “maldita”. Em meio a tantas coisas ruins, ela simplesmente nos apresentou um Brasil cheio de problemas, de coisas erradas, mas que realmente nos representa. Tomara que neste mês que falta para o Rio 2016 ela possa nos ensinar mais coisas. Obrigado tocha “maldita”, muito obrigado.

10 respostas
  1. JOSE RUDINEY DE SOUSA MIRANDA
    JOSE RUDINEY DE SOUSA MIRANDA says:

    Acho que a Tocha Olímpica, que percorre o Brasil, não é maldita, apenas esta mostrando a realidade para os brasileiros.

  2. Beatriz R Carrijo
    Beatriz R Carrijo says:

    Disse tudo. Fui condutora pelo COB e foi muito especial. Povo brasileiro peca nas suas críticas por ignorância. Não sabem o significado histórico dos fatos. E não estão gostando do país que veio à tona com toda movimentação. Que aproveitem está indignação pra “jogar água em quem merece”

  3. Adonai
    Adonai says:

    Tem muito sentido o texto, mas a tocha e seu fogo tem mostrado ao povo e tem dado o devido reconhecimento a pessoas que fazem tanto pelo nosso Brasil. Muitos incentivadores e esportistas que contribuem muito para comunidades, como por exemplo o Jorginho de Aracruz- ES!
    E que através do seu trabalho e a oportunidade que foi dada de carregar a tocha na sua regiao, elevam ainda mais a esperança para aqueles que vêem nele e no esporte a saída para um futuro melhor!

  4. Adelmira
    Adelmira says:

    O custo de R$ 1890,00 se não engano foi o de ‘ficar’ com a tocha que esse ex atleta olímpico carregou, a namorada comprou para lhe dar de presente….e reclamou….
    Imaginem se todos que carregassem pudessem levá-la para casa de lembrança…maravilhoso…mas quem pagaria….quem quer que pegue…se pagou é por que PODE…e reclama porquê!???

  5. Eliel
    Eliel says:

    Vi um recibo de pagamento do jogador de volei Gustavo Endler de quase 2 mil reais para participar. Sera veridico essa seleção paga e nao paga?

  6. Katia Rubio
    Katia Rubio says:

    Valeu coach. Ainda não desisti de fazer o fogo chegar aos olímpicos. Dia 24 de julho, no estádio do Pacaembu, a partir das 15 horas, faremos uma grande homenagem aos olímpicos por aqui. Será o dia da tocha em São Paulo e os olímpicos receberão uma homenagem de São Paulo. Se a tocha não vai até eles, eles irão até a tocha. Fazemos a nossa parte e ficamos com a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo. Grande abraço.

  7. José Carlos Gomes
    José Carlos Gomes says:

    O autor produziu um belo “maldito” texto, bem em conformidade com a matéria que apropriadamente ilustrou. Ressalta aspectos conhecidos por muitos e distorcidos por outros, mas oportunamente esclarecedor e corajosamente opinativo.
    Parabéns pela abordagem!

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