Guilherme Bobbo Passos, é um jovem treinador brasileiro, 27 anos de idade, natural de Piracicaba (SP), radicado nos Estados Unidos. Nadador de destaque revelado no Yara Clube de Marília, fez sucesso na equipe júnior do Pinheiros antes de se transferir para os Estados Unidos onde nadou e estudou na UNLV, em Las Vegas, Estado de Nevada.

Lá, Passos se graduou em Estudos Interdisciplinares com especialização em Hotelaria. Foi na própria UNLV que começou a dar seus primeiros treinos. Atuou como assistente da equipe antes de assumir a posição de Assistant Coach no Memphis Thunder Aquatic Club em Collierville, Tennessee. Além de trabalhar com dois grupos de categoria, Coach Passos também treina duas equipes de high school Arlington e Briarcrest.

Coach Guilherme Passos foi o único treinador brasileiro presente a 9o Encontro Anual dos Treinadores da ISCA em Clearwater, na Flórida e traz para a Best Swimming um relato do que foram as apresentações dos quatro dias de evento.

Acompanhei de 28 a 31 de agosto em Clearwater, na Flórida, o 9º Encontro Anual de Técnicos da ISCA(International Swim Coaches Association) e a indução ao Hall da Fama da mesma instituição. Os três técnicos homenageados este ano foram Mark Bernardino, Bill Rose e Kevin Weldon. Ao longo da semana, vários painéis de especialistas separados por especificidade foram proporcionados aos técnicos participantes do evento. A qualidade dos técnicos e cientistas convidados nos painéis foi bem acima da média quando comparado a outras clínicas disponíveis nos Estados Unidos com muita informação relevante compartilhado. O único lado negativo foi a organização do evento, um pouco ultrapassada e faltando comunicação clara e objetiva.

No primeiro dia do evento, após o registro, foi oferecido aos participantes os cursos de atualização nas credenciais de treinador da ISCA. O segundo dia, na minha opinião, o melhor dia da clínica. Na abertura com o presidente da ISCA, Doug Fonder, explicando os valores da associação e como pretendem conectar ciência e natação a nível internacional. Logo após o Dr. Scott McLean, biomecânico esportivo e Professor e Diretor do departamento de Kinesiology da Southwestern University, demonstrou a ciência por trás de uma saída eficiente. Dois pontos muito interessantes foram o “Angular Momentum” e a importância da perna de trás. Dr. McLean explicou que o deslocamento gerado pela perna de trás e a amplitude angular durante o voo são fundamentais para uma saída mais rápida e o mais distante possível sem comprometer o ângulo de entrada na agua. Ele foi muito claro nas explicações e usou de uma linguagem de borda de piscina e não laboratorial, exemplificando muitos dos movimentos e incluindo vídeos de saídas.

Logo em seguido, tivemos o primeiro painel com técnicos de velocidade, Gregg Troy(Gators), Todd DeSorbo(UVA), Matt Kredich(UTknox), Braden Holloway(NC State). A parte mais interessante foi ver técnicos de muito sucesso com velocista usarem técnicas e filosofias tão diferentes. Troy e um técnico muito atualizado e treina o melhor velocista da atualidade, Caleb Dressel, mas ainda sim tem uma tendência a treinar metragens longas e acredita muito na mistura do novo com o que sempre deu certo. Holloway e Desorbo são dois técnicos que estão despontando muito com programas de velocidade, principalmente na NC State com Blake Pieroni e companhia. Os dois seguem uma linha USRPT (Ultra Short Race Pace Trainning), que tem funcionado muito bem para alguns programas, o maior exemplo Michael Andrew. Matt Kredich tem uma visão mais “zen” da natação, tudo ‘e parte de um sistema, tudo está conectado, um treinador muito técnico e focado na qualidade. UT Knoxville tem obtido ótimos resultados no NCAA e possui um grupo muito forte de velocistas no clube TNAQ. Além de explicarem muito da fundamentação de suas temporadas, os técnicos responderam perguntas dos convidados. Os pontos mais interessantes em minha opiniao foram os aspectos técnicos e psicológicos do treinamento. Kredich ressaltou a importância da comunicação com os atletas e criar um vocabulário que vá além de sentindo bem e sentindo mal, ser mais especifico na comunicação. DeSorbo explicou que ele se baseia muito no desempenho do atleta durante o treino. Usando o modelo USRPT os treinos são muito intensos, mas ele disse que não usa regenerativo. DeSorbo tentar levar todo treino ao limite e tenta não passar do limite para não causar stress excessivo, necessitando assim regenerativo. Troy falou muito sobre trabalhar as fraquezas e explicou como no caso de Dressel ele passou uma temporada inteira focado nas últimas 15 jardas do 50 livre. Kredich e Holloway explicaram sobre manter a velocidade e eliminar “dead spots”, transições e viradas principalmente. Troy entrou na conversa e explicou como o Dressel aprendeu muito de transição com Arkady Vyatchanin e usa a golfinhada até o inicio da primeira braçada. A parte técnica é muito interessante, mas ver a dinâmica entre estes grandes treinadores e quanto eles ainda aprendem uns com os outros foi uma experiência única.

Ainda no segundo dia tivemos uma palestra sobre prevenção de abuso, bullying, e “harassment”. Recentemente nos Estados Unidos e no mundo tivemos vários casos de abuso vindo a tona e a USA Swimming e a ISCA estão tentando conscientizar e informar todos os seus membros sobre como prevenir e como agir nestas situações. No geral alguns recursos importantes foram apresentados aos técnicos, mas nada fora dos padrões já requisitados e apresentados anteriormente a todos os técnicos. A noite tivemos um coquetel de confraternização para os técnicos interagirem e trocarem conhecimento. Alguns dos palestrantes estavam presentes e foi uma boa oportunidade para conhecer técnicos de lugares distintos com problemas similares.

Começamos o terceiro dia com o painel de distância e águas abertas formado por Mark Bernardino(NC State), Tyler Fenwick(UVA), Bill Rose(Mission Viejo), Gregg Troy(Gators), Kevin Weldon(Dayton). Outro ótimo painel com uma dinâmica bem interessante, principalmente analisando que estes técnicos trabalham em conjunto com outros técnicos que compuseram o painel de velocidade. Fenwick começou falando o quanto ele aprecia as provas e o treinamento de distância e que gosta de rodar muito. Ele acredita que “Work Works” , trabalho traz resultado. Ele disse que o maior desafio é vender a idéia de nadar provas longas, especialmente em uma sociedade que espera gratificação instantânea. Mas se você vender bem o seu peixe e empoderar estes atletas de distância o resultado virá. Bernardino ressaltou a importância de reconhecer a capacidade aeróbica destes nadadores como um talento, assim como reconhecemos velocidade e força como talentos. Ele também ressaltou a importância de ser criativo com os treinos de distância e manter o interesse dos nadadores, bastante mudança de distância e equipamentos por exemplo. Bill Rose falou que a maioria dos nadadores de distância gostam de ter objetivos claros, e repetir séries durante a temporada para medir o progresso. Coach Rose também explicou que para o sucesso nos eventos longos o nadador precisa aprender a ficar confortável com o desconforto, praticamente se adaptar ao stress. Troy explicou que trabalha muito em séries de medley e também séries que começam braço e transacionam para nado e depois para perna. Em geral todos falaram em 70K por semana diferente dos 100K semana que usavam no passado. A maioria deles disseram que usam mais exercícios de dryland, Medicine Ball, etc e muito pouca musculação. Fenwick falou que não faz musculação com os nadadores de distância. Interessante de pensar como Fenwick e Desorbo irão trabalhar juntos e também Bernardino e Holloway. Ou sucesso absoluto ou um desastre.

No mesmo estava marcado um painel de marketing, mas os convidados não puderam comparecer, um técnico que trabalha para a Isca preparou uma apresentação e explicou a experiência dele. Para algo improvisado ele se saiu muito bem. Ele falou da importância de criar uma imagem para o time e decide quem entra no time baseado no perfil desejado. Uso de mídias sócias para monitorar candidatos e também para criar uma imagem para o time. Logo após tivemos Dr. Joao Paulo Vilas-Boas(Universidade do Porto) explicando sua experiência no uso de força da braçada relacionado ao consumo de O2 e quando os picos de VO2 são alcançados. A explicação foi muito científica e difícil de entender suas aplicações práticas na piscina. Quando a seção de questões foi aberta ele foi capaz de explicar em uma linguagem mais acessível aos técnicos. Em resumo a conclusão de seus estudos diz que os picos de VO2 ocorrem nos primeiros 10segundos de forca máxima e séries de lactato devem ser feitas em distâncias curtas 50 melhor que 100 e intervalos altos. A última palestra do dia foi de John Doolittle, retired Navy Seal Captain. Ele contou muito de sua experiência e da seleção para chegar lá. Muito motivacional e a parte mais importante foi entender que situações adversar criam resiliência. O quanto a parte mental é importante comparado com a parte física. A noite ocorreu o jantar e indução ao Hall da Fama dos três técnicos mencionados anteriormente.

O quarto e último dia começou com um painel sobre desenvolver o trabalho das categorias de base com Kevin Weldon(Dayton), Don Lemiux(greenwood), Abby Knox(Foothill,Canada), Erkan Gunay(Turquia). Dr.Knox além de técnica e nutricionista e mãe de três nadadores. Ela explicou a importância dos carbo-hidratos para atletas e como as dietas cetogênicas podem não ser ideais para os nadadores. Em suas pesquisas ela mostrou que produzir energia queimando gordura utiliza mais oxigênio do que usando carbohidratos, causando mais fadiga. Ela também mostrou a importância de chegar os níveis de ferritina, e que nadadores precisam de uma ferritina alta. Os sintomas de um nível de ferro baixo são parecidos com os da depressão e alta fadiga. Don Lemiux falou que está tentando integrar elementos de outros esportes no treino da natação e fazer tudo mais divertido e motivacional para as crianças. Ele disse que fez parcerias com professores de yoga e ginástica para trabalhar com os nadadores uma vez por semana. Weldon e Lemiux disseram que não cobrar atletas de treinar todos os dias, este talvez seja um problema mais comum nos Estados Unidos, atletas praticando vários esportes. Para eles é mais importante atletas motivados 2 ou 3 vezes por semana do que atletas entediados 6 dias da semana. Weldon falou para tentarmos estratégias diferentes e usarmos novos elementos no treino, “muitos técnicos fazendo a mesma coisa, faça algo novo, seja ousado”.

O ultimo painel foi sobre inovações cientificas na natação com Dr. Rod Havriluk(biomecânico), Dr. Joao Paulo Vilas-Boas (Biomecânico). Os dois ressaltaram a importância de ter um ângulo negativo na rotacao do braço, ou seja evitar o catch up. Outro ponto foi começar o braçada o mais rápido possível quando a mão entra na agua. Os dois pontos são muito importante e já usados na natação moderna. O ponto onde eu discordei com o professor e pedi explicação extra foi em como a mão chega na posição inicial. Em suas pesquisas Havriluk chegou a conclusão que a mão deve entrar na agua perto da cabeça num ângulo que a coloca diretamente abaixo do ombro onde começa a pegada (catch). Eu acredito que outros fatores não foram levados em conta como o atrito da agua e a posição do corpo para chegar na posição inicial do catch. Eu acredito que um estilo mais longo e ate um braço reto coloca o seu corpo e braço em uma posição melhor para o catch, com menos atrito e muito pouca perda de tempo entre entrada da mão e posição inicial. Terei que observar a natação nos próximos anos e ver se o cientista tinha razão.

Concluindo eu achei a experiência válida e aprendi muito com os painéis. Ouvir alguns dos melhores técnicos do mundo debater sobre métodos de treinamento tanto no aspecto físico, técnico ou psicológico foi uma experiência sensacional. Alguns pontos negativos foram a organização do evento e alguns palestrantes. Comunicação muito ultrapassada e ninguém sabia informar sobre os eventos. Alguns dos eventos não ocorreram por falta de organização ou por palestrantes que não compareceram. Alguns dos palestrantes internacionais não souberam explicar suas ideias e o inglês de alguns incompreensíveis. Eu adoraria voltar em próximas edições, mas antes algumas mudanças têm de ser feitas.

Guilherme Passos, Assistant Coach at Memphis Thunder Aquatic Club
Twitter @gui_bobbo
Instagram @passosgswim
Email coachgpassos@gmail.com

Site do Memphis Thunder Aquatic Club
https://www.teamunify.com/Home.jsp?team=semtac

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