Se tem uma coisa que aprendi com a natação americana em 16 anos trabalhando por lá, foi como eles conseguem fazer da natação uma modalidade coletiva. Isso mesmo, os americanos são craques nisso.

Conseguem mobilizar seus atletas, todos torcendo por todos, todos envolvidos na competição, todos brilhando nos revezamentos, quase sempre nadando melhor do que nas provas individuais. Isso é cultural. Vem desde o esporte escolar, passa pelos clubes, fica gigante no esporte universitário e imbatível no Team USA.

É um exemplo e tanto, mas é Estados Unidos, um país de uma cultura e tradição esportiva com dimensão muito maior do que nós.
Como todos que acompanham o esporte fiquei contente com a classificação da nossa equipe de ginástica masculina para o Rio 2016. Feito inédito ao terminar em sétimo lugar as eliminatórias da competição em andamento em Glasgow, na Escócia.

Era o objetivo principal, e plenamente atingido. Os resultados de Arthur Zanetti, Arthur Nory, Francisco Barreto, Caio Souza, Lucas Bittencourt e Péricles da Silva são a realização de um plano, de um programa. Parabéns moçada!

A prioridade acabou comprometendo o programa de nosso melhor ginasta. Aliás, não é só nosso, é do mundo. Arthur Zanetti deixou um pouco de lado seu treinamento das argolas onde domina o planeta desde 2011 para ajudar seus companheiros na disputa dos outros aparelhos.

Zanetti campeão da Universíade e vice mundial em 2011, campeão olímpico em 2012, campeão mundial em 2013, vice mundial em 2014, não se classificou para a final da “sua” prova em Glasgow.

Tenho minhas dúvidas em dizer isso: “O sacrifício não foi em vão, afinal a equipe se classificou para o Rio 2016, a primeira vez que o nosso país vai ter uma equipe completa numa Olimpíada”.

Como citei antes, não somos os Estados Unidos. Não temos esta quantidade enorme de atletas e abundância de medalhas.

Como Zanetti se sacrificou, há também o caso de nosso melhor atleta da canoagem. O baiano Isaquías Queiroz abriu mão de disputar a sua especialidade, prova em que foi bronze no último Mundial para conseguir classificar o barco C2 junto com Erlon Silva conquistando o ouro, no Mundial de Milão e a vaga para o Rio 2016.

Isaquías nem disputou a sua prova e ajudou o Brasil a ter dois barcos e dois atletas no Rio 2016.

Nem ele, nem a controversa Confederação de Canoagem que tem um presidente há 27 anos no poder (só perde para Coaracy Nunes na CBDA) falam dos planos para o Rio 2016.

Na natação também enfrentamos inúmeros casos onde o atleta precisa decidir pela “equipe” ou pela prova que tenha mais chance, e não por si só.

Lembro de Cesar Cielo, muito criticado em competições internacionais onde o revezamento do Brasil ou nadou sem ele, ou nem nadou, como no Pan Pacífico de 2010.

O argumento foi sempre priorizar onde o Brasil, no caso Cielo, tinha mais chances. Sei que existe uma quantidade grande pessoas que acha que tem de ser sempre pela equipe, mas volto a lembrar que não somos os Estados Unidos. Somos um país de raras, de poucas, de minguadas medalhas, precisamos sempre focar nas melhores chances.

As pessoas tem memória curta. Esqueceram que Gustavo Borges vivenciou o mesmo problema. Em 2000, nos Jogos de Sydney, Gustavo não estava em bom momento. Era nosso melhor nadador de 200 livre, pediu e ficou de fora do 4×200. No 4×100 livre que trouxe a histórica prata, Gustavo não queria fechar, estratégia que utilizávamos há algumas temporadas.

Seu estado físico não era dos melhores. Sua confiança também não. Foi aí que surgiu a estratégia sugerida pelo treinador baiano Sérgio Silva, responsável pelo também baiano Edvaldo Valério Bala que fez história naquele final de prova com o bronze que valeu como ouro.

Para o Rio 2016, a natação brasileira vai bater o recorde do número de atletas. Já são mais de 30. Isso é bom, mas não é tudo. O que vale e o que entra para a história, são as medalhas.

Nossa maior delegação da natação olímpica foi em Beijing 2008. Foram 27 nadadores com desempenho de seis finais e duas semifinais. Duas medalhas, o ouro dos 50 livre e bronze nos 100 livre, ambas com Cesar Cielo. Em 1996, em Atlanta, foram três medalhas, cinco finais e três semifinais, e somente 12 atletas.

Embora todos estamos torcendo para uma delegação grande, cheia de representatividade, muitas finais, muitas semifinais, o que conta mesmo, são as medalhas.

Não estamos falando de esporte de desenvolvimento, isso é alto nível. É elite mesmo. A prova disso é que o orçamento encurtado na preparação pré-Olímpica vai ser limitado e destinado aos atletas que tem maior chance de sucesso. Corretíssima medida.

O questionamento é controverso. Queremos todos o sucesso do time, da equipe toda, mas a medalha é a referência, o objetivo maior.

Por isso, Arthur Zanetti deve, e vai, priorizar o treinamento nas argolas. Isaquías Queiroz, deve e vai, fazer um treinamento voltado para a prova onde vai conseguir o melhor resultado e represente a maior chance de medalha.

Na natação não vai ser diferente. Comissão técnica e atletas vão precisar estar conscientes de suas chances e sair em busca de suas melhores marcas e resultados. O espírito de equipe não é só nadar juntos uma prova e sim entender todo o processo competitivo, principalmente priorizando onde estão as melhores chances.

A verdadeira equipe é aquela que se junta para fazer o melhor, mas também sabe dividir as dificuldades e maus resultados. A medalha ou, tomara, as medalhas que virão, serão resultado de tudo isso.

Coach Alex Pussieldi, editor chefe da Best Swimming Inc.

12 respostas
  1. DDias
    DDias says:

    Coach,
    como respeito muito a sua opinião, acho interessante você fazer um post a respeito do porquê você acha que ele tem mais chances(mesmo de OURO!) nos 100 do que nos 50.
    Na minha humilde opinião, o melhor 100 dele foi aquele 47.07 do revezamento do pan de 2011.Aquela volta foi fenomenal(algo na casa fo 24.5), mas acho que 50 é uma prova “mais nervosa” do que os 100, onde muitos favoritos tropeçam.
    Você acha que o Cielo tem um 47.4 nele , coach?(Acho que será o máximo tempo para o Ouro ano que vem).

  2. iago
    iago says:

    Falou muito bem cordani, não dá para aceitar o cielo deixar de nadar o revezamento com chance da medalha tao falada pelo coach, sendo que a distancia entre as provas para a recuperação era de um dia!! ai fica dificl aceitar

  3. Carlos oliveira
    Carlos oliveira says:

    Coach
    A ocasião mais recente em que Cielo brilhou, para mim, foi no mundial de curta; e ele nadou 50L, 100L (muito bem), 50B, 4×50, 4x100M, 4x100L, rev misto, …..fez o melhor 100L sem traje na prova e no rev…

  4. Rodrigo G
    Rodrigo G says:

    Coach, conpartilho com,você a opinião sobre a chance do ouro ser maior no 4×100 do que nos 50, e ainda acho que treinar para os 100 não tiraria as chances do Cielo em,brigar por uma medalha nos 50… Mas tenho a impressão de que ler esse tipo de opinião deve doer pro Cieli a mesma dor que dói pro Thiago ao ouvir o clamor para que nade os 400 medley.

  5. Dory
    Dory says:

    Coach assim como o Sr acha que o Cielo tem mais chances nos 100 livre,o Sr não acha que o Thiago Pereira tem mais chances nos 400 medley?

  6. Wiliam Duarte
    Wiliam Duarte says:

    Ramon, as seletivas para Rio 2016 ainda não aconteceram, portanto, as vagas continuam abertas, mesmo a despeito de termos alguns francos favoritos. Mas não se assuste se surgirem novos nomes no time olímpico brasileiro e em provas que, aparentemente, já possuem figuras carimbadas.

  7. Alex Pussieldi
    Alex Pussieldi says:

    Valeu Cordani,
    1) Sobre o bronze dourado, é porque não tínhamos time para chegar nem perto dos australianos e americanos, batemos equipes que teoricamente eram mais fortes do que nós e ainda tivemos a sorte da desclassificação da Holanda nas eliminatórias. A sensação foi de vitória, por isso a menção.
    2) Zanetti foi prejudicado no seu treinamento para as argolas. Não foi um dia, foram meses de treinamento fazendo aparelhos que ele não faz e tombos que ele não toma. Fez pelo time. Cielo ou Gustavo, como citado no texto, foram preservados para as provas onde tinham mais chances, ficando de fora para o bem da equipe.
    3) Por fim, se eu fosse o técnico do Cielo, eu treinaria ele para os 100 livre, acho uma possibilidade de ouro muito mais aberta do que os 50, pelo menos foi o que vimos em 2015.

  8. rcordani
    rcordani says:

    Oi Coach, tenho duas contribuições ao belo texto:

    1) o bronze de Sydney foi espetacular, mas valeu bronze mesmo :-).

    2) o caso do Zanetti é bem diferente do do Cielo. No caso do Zanetti, para pegar classificação por equipes ele teve que treinar outros aparelhos, é como se mandassem o Cielo nadar PEITO no reveza, mas não, queremos que o Cielo nade apenas mais uma vez uma prova que ele já nada e é recordista mundial. Seria o mesmo que o Zanetti competir na argola individual, mas se recusasse a fazer a argola no revezamento, essa é a crítica.

    Mas concordo muito com o cerne do texto, e acho que para 2016 o Brasil precisa ter um TIME, e crescer individualmente em cima do coletivo.

  9. Ramon
    Ramon says:

    Na sua opiniao, com os ultimos resultados e possiveis evolucoes dos brasileiros. Quais sao as reais chances de medalha do brasil?
    50L=bruno – cielo
    200M= thiago
    ———————-
    4x100L=?
    200B=leo
    400M-1500L=brandon
    100P=frança
    4x100M=?
    Vc pode dizer sua projeçao?

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