23 de outubro de 2010, era a última etapa da Copa do Mundo de Águas Abertas da FINA, praia de Fujairah, nos Emirados Árabes Unidos. A prova que fechava a temporada já tinha o campeão definido, o sul-africano Chad Ho, o vice, o americano Francis Crippen e o terceiro colocado, o brasileiro Allan do Carmo. Entretanto, a regra da época tinha um item que determinava que os atletas que brigavam pelas três primeiras posições do ranking e suas respectivas premiações, precisavam terminar a prova que fechava a temporada.

Al-Fujairah é um dos sete emirados que fazem parte dos Emirados Árabes Unidos. É o segundo menor, único montanhoso e que cobre apenas 2% do território nacional. Fazia calor naquele dia, em torno dos 29 graus. Um pouco acima da média da época. Mais quente estava a água, embora nunca divulgada, se falava em acima dos 30 graus.

Crippen bronze no Mundial de 2009

Pior que que a temperatura da água, só mesmo a segurança montada pela organização local. Poucos barcos, poucas pessoas trabalhando na prova. Mesmo assim, não era a primeira vez que aquilo acontecia, mas foi a última. Atletas e treinadores das águas abertas reconhecem que condições ainda piores já haviam sido vistas em provas anteriores, mas a trágica morte de Francis Crippen iria mudar para sempre a história do esporte.

Francis Crippen tinha 26 anos de idade. Único homem entre as três irmãs, todos nadadores, e todos integrantes da Seleção Americana. Era um dos melhores nadadores de águas abertas do mundo. No ano anterior, foi bronze no Mundial de Roma na prova dos 10 quilômetros. No Pan Pacífico tinha duas medalhas de prata nas provas de 2006 e 2010. Foi o primeiro campeão pan-americano das águas abertas ao vencer a prova dos 10 quilômetros no Pan do Rio, em 2007.

Crippen campeão dos 10k no Pan de 2007

Crippen também brilhava na piscina. Esteve no Pan de 2003 e foi prata nos 400 e 1500 metros nado livre. Na semana anterior a sua morte, Crippen venceu a prova dos 10 quilômetros da Copa do Mundo em Cancún, no México.

Na prova em Fujairah, a equipe americana viajou com três atletas e apenas um treinador. Crippen e Alex Meyer entre os homens e Eva Fabian, esta acompanhada de seu pai e técnico, Jack Fabian. Meyer optou por não disputar a prova e ficou na praia acompanhando a disputa.

Na penúltima volta, Crippen revelou a Fabian no local de alimentação que estava com sede, nadava com dificuldade, mas pelos critérios da FINA, precisava completar a prova. O faria com dificuldade. Na última volta, com a passagem de quase todos nadadores, Fabian abandonou o local e foi esperar a chegada na praia.

Desespero na praia de Fujairah com a morte de Crippen

Crippen nunca chegou. Passava cerca de 90 minutos do final da prova quando Alex Meyer começa desesperadamente a gritar em busca do companheiro. Atletas saem correndo de volta para a água em busca do companheiro que estava desaparecido. Foram duas horas de busca até que um grupo de salvamento resgatou o corpo de Crippen submerso a cerca de 500 metros da chegada.

Muitos nadadores passaram mal na prova e vários deles foram transportados para o hospital local. Um deles foi o brasileiro Allan do Carmo. Foi Allan e seu treinador Rogério Arapiraca, que estavam no hospital, os primeiros a serem informados da morte do nadador americano.

A tragédia gerou uma crise até hoje não resolvida entre FINA e USA Swimming. O calendário das águas abertas foi suspenso e prorrogado até a reformulação das regras. Novos critérios, novas medidas implantadas. Não existiam os limites de temperatura mínima ou máxima. Caiu a obrigação de “completar” a última prova para apenas “participar” da mesma.

Fujairah e os Emirados Árabes Unidos foram retirados do calendário das águas abertas. Só voltaram há três anos e sob muitos protestos da Federação Americana. Tem se mantido no programa por pagar os maiores prêmios da temporada, três vezes mais do que as outras provas. Mesmo assim, a USA Swimming não autoriza e nem envia equipe para as disputas.

O laudo e investigação da morte de Francis Crippen nunca foi aberto a imprensa. Fala-se em mal súbito, parada cardíaca, mas jamais se teve os dados concretos do que realmente aconteceu. Foi uma decisão da família. Também não aconteceu processo contra a FINA. A família rejeitou qualquer compensação da FINA e abriu uma fundação que leva o nome do nadador. Todos os anos, uma verba é distribuída para nadadores de águas abertas beneficiados pela iniciativa.

O esporte das águas abertas ficou mais normatizado e regulado desde então. O crescimento já era exponencial, mas, infelizmente, foi a morte de Francis Crippen que determinou os novos caminhos que a modalidade tomou.

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