Madisyn Cox deu uma entusiasmada e alegre entrevista num programa de internet produzido pela USA Swimming chamado “Deck Pass”. A ex-medalhista olímpica Amy Van Dyken e o ex-medalhista panamericano Jeff Commings fazem um belo trabalho no “esquenta” e no pós de cada etapa do Campeonato Americano. Um verdadeiro show.
Entre perguntas animadas e divertidas, rolava algo como “o que você come no café da manhã”, “quais provas você vai nadar no US Olympic Trials”, e um papo bem descontraído. Lá no finalzinho, uma pequena citação de Commings “no ano passado, foi um ano difícil e que retorno”. Ele falava discretamente do teste positivo de Cox e seu retorno para o título de campeã americana dos 200 metros peito.
Cox foi bronze no Mundial de Budapeste, em 2017, nos 200 medley e ainda integrou o revezamento campeão do 4×200 livre. Depois disso, testou positivo para Trimetazidine, uma substância proibida e que ela não sabe como foi parar no seu corpo. Inicialmente suspensa por dois anos, apelou junto ao CAS/TAS e teve sua punição reduzida para seis meses.
Doping e suspensão que ficaram para trás, como deveria ser. Afinal, o código de controle de dopagem tem regras e protocolos determinados. Você cometeu um erro, é julgado, paga por isso, e jogo que segue. Foi assim com Madisyn Cox, mas não é sempre assim.
Trimetazidine é a mesma droga que Sun Yang testou positivo em 2014. Imagine você!
Diferente de Cox, o chinês usa a droga até hoje. Ele tem um problema de coração e a droga entrou na lista das substâncias proibidas em janeiro daquele ano. Sun Yang não apresentou o chamado TUE, autorização para uso terapêutico e foi punido por três meses de suspensão. Diferente de Cox, Sun Yang é o nadador mais “dopado do mundo”.
Não vou defender o chinês (nem dá) que conseguiu construir uma péssima imagem e reputação no convívio e contato com outros atletas no cenário internacional, mas também não posso aceitar que ele seja o “dopado” que conseguiram construir.
Sun Yang vai enfrentar o Tribunal da Corte Suprema em setembro, e frente ao CAS/TAS vai apresentar os argumentos que o levaram a destruir as amostras de sangue coletadas em sua residência em setembro do ano passado. Ao seu lado, o fato, já confirmado, de um dos fiscais não ter autorização para estar na sua residência. Contra ele, a sua violência, agressividade, os seus atos toscos e injustificados.
Na FINA, Sun Yang foi absolvido, embora no relatório de 59 páginas tenha recebido um “chamado” por mau comportamento, mas nada de punição. A WADA não concordou com a deliberação da FINA e levou o caso para o CAS/TAS.
Defendido por um dos melhores advogados esportivos da China, Sun Yang ainda tem uma forte empresa de direito esportivo da Suiça no seu time de defesa. Durante o Mundial, e com a constante pressão da mídia internacional, chegou a anunciar que vai pedir que o julgamento seja aberto a imprensa. Algo que só aconteceu uma vez na natação, ainda na década de 90, com a irlandesa Michelle Smith, banida do esporte.
Banimento é o que querem os críticos de Sun Yang. Seria sua segunda infração ao código de dopagem, ou se absolvido, e confirmado o julgamento que recebeu do Painel de Doping da FINA, aquele montão de críticas desproporcionais.
Os episódios de pódio do Mundial de Gwangju foram péssimos para o esporte e promovidos de forma irresponsável. A começar pela mídia australiana que agora lida com um sentimento de vergonha nacional.
Mack Horton saiu em defesa do “jogo limpo” se negou a subir ao lado no pódio e tirar foto com um “nadador sujo”, mas mal sabia ele que a Federação Australiana havia dispensado uma companheira de equipe poucos dias antes, sem comunicar nada ao grupo.
O primeiro a gritar “hipocrisia”, e de forma bem ostensiva, foi o treinador de Sun Yang. Por acaso o australiano Dennis Cotterell, um dos melhores treinadores não só de seu país, mas do mundo. De reputação e resultados incontestáveis, Cotterell reclamou muito da forma como o caso foi abordado pelos seus compatriotas.
Naquele primeiro momento, Cotterell era uma voz solitária. Com o caso de Shayna Jack explodindo, a opinião pública mudou de lado. A imprensa ainda mais.
O último grito veio de Richard Pound, ex-Presidente da WADA, que é australiano e não poupou críticas aos compatriotas e em especial a Swimming Austrália pela péssima condução do caso.
Nesta quinta-feira, o nadador peruano Mauricio Fiol usou suas redes sociais para anunciar que sem saber como nem porque, teve dois de seus últimos testes anti-doping apresentando resultados positivos para a presença de Estanozolol. A mesma droga, a mesma, que foi detectada no seu organismo em teste durante os Jogos Pan Americanos de Toronto em 2015.
Fiol, o mais expressivo nadador peruano das últimas décadas, passou por tribunais, gastou milhares de dólares, mas mesmo assim ganhou a punição máxima de quatro anos de suspensão. Durante todo este período, nunca desistiu, sempre proclamando sua inocência cruzou o país, deu cursos, palestras, clínicas, nadou travessias, treinou sozinho, sempre em forma e sempre na busca do seu retorno.
Desde dezembro, Fiol treinava com o brasileiro Reinaldo Dias. Foi com ele que conseguiu seus primeiros grandes resultados, e aposentado sem qualquer relação de clube ou federação, o brasileiro era o único que poderia treinar Fiol.
Os dois trabalhavam duro e os resultados iam muito bem. Fiol bateu recordes nacionais em treino, nadou uma competição no Chile e já mostrava estar em uma de suas melhores fases.
Na volta de nadadores que saem de suspensão, constantes testes são de praxe. Assim, Fiol foi submetido a quatro deles em dois meses, dois deram negativo, dois positivo. Fiol está fora do Pan, e bem provável, está banido do esporte. Ninguém no Perú é capaz de explicar. O choque é geral.
Tive o prazer de dar treino para Fiol, há oito anos. Bom garoto, talentoso, dedicado, esforçado. Não foi o meu primeiro atleta que testou positivo, talvez ainda outros ainda possam testar a frente. O doping existe, é global, em todos países, em todos os esportes.
Por mais que você trabalhe de forma adequada, por mais que você se esforce em fazer a coisa certa, sempre estamos a mercê de algum descuido, e também de alguma má intenção. Infelizmente, é algo inerente a nossa capacidade de controle. Não bastam os bons princípios de ética e bom trabalho, os riscos sempre existirão.
O consumo indiscriminado de suplementos, a grande fonte de tudo isso que estamos vivenciando só aumenta, e os riscos para novos casos, se multiplicam.
Me incomoda muito o procedimento de apontar o dedo e acusar aos outros atletas como se isso fosse resolver alguma coisa. Doping se combate com educação, com controle e com punições aos culpados. Se existe uma regra, um código que ele cuide e puna os culpados.
Para mim soa até estranho ver brasileiros “apontando os dedos” para Sun Yang e qualquer outro atleta que tenha testado positivo como se fossem “trapaceiros” e nós, totalmente isentos e limpos.
Não preciso aqui listar a enorme lista de atletas da seleção brasileira que já testaram positivo. Não é necessário. Muitas de suas histórias, muitas de suas declarações eu acredito, vários eu realmente penso que são inocentes. Porém, minha opinião, ou a sua sobre a minha opinião, não valem nada. O que determina e regula o doping e suas infrações são os Paineis de Doping, as regras, os controles.
O que eu, você, ou nós achamos, ou condenamos, pouco muda. A regra e os controles existem para isso. O doping é um problema de todos. Lembro que há poucos anos, nunca havíamos tido um só caso de doping na história do esporte japonês. Bastou a escolha de Tóquio para ser sede da Olimpíada, já vamos em quase uma dezena de atletas com resultado positivo.
Como amante do esporte, sou contrário ao uso de qualquer substância proibida. Reconheço ser algo que faz muito mal aos jovens, fere a ética, abala a confiança e até mesmo expõe uma péssima imagem da nossa atividade. Entretanto, prefiro e procuro confiar nas instituições, nas suas regras, nas suas determinações. “Apontar o dedo” não resolve, aliás, só esconde a realidade. Estamos todos nesta, seja como vítimas ou culpados.
Por Alexandre Pussieldi, editor chefe da Best Swimming
O tema “doping” tem relação semelhante ao “bullying”, é uma problemática que deve ser enfatizada desde a natação de base. Educadores e treinadores precisam trazer esse tema ao convívio ético dos atletas de sua equipe, principalmente desde as categorias de maiores destaques. Outro dia uma matéria dizia que 01 kg de espinafre por dia causaria aumento da força explosiva e por isso, estavam querendo incluir na lista de substâncias proibidas. Quem neste mundo consome um quilograma de espinafre por dia? Por outro lado, qual o problema em um atleta querer estar mais forte? Mesmo estando “mais forte”, isso não determina que já tenha ganho a prova antes de competir, tudo pode acontecer: pode esquecer a sunga no carro, escorregar no blog, passar dos 15m submerso, fazer uma virada irregular, jogar água de costas contra o adversário etc… Tudo pode acontecer e ninguém precisa “estar culpado” antes que tenha conseguido vantagem comprovadamente contra outro que tenha “obedecido aos critérios”. Por ser de tal forma delicado esse assunto, acredito que certas substâncias listadas como “doping”, se forem consideradas processadas pela indústria e não encontradas “in natura” na Natureza, isso também deve ser questionado de forma ética.
Eu achei que o Mack Horton foi corajoso até demais e o que fez tinha que ser feito mesmo. Já encontrei nadadores que só se “instigavam” pra competir se tomassem certas substâncias “extras”. Ou seja, existe sim aqueles nadadores que conhecem seus adversários e tremem das pernas, mas para querer ganhar deles, não jogam limpo em sua preparação e preferem tomar isso aqui ou ali, mesmo que isso não faça diferença na piscina, mas funcione como um estimulante psicológico. Em outras palavras, empregam sua potencialidade mental numa substância química e assim, por mais ingênua que seja a intenção, merecem ser punidos.
Que culpa tem o Mack Horton se a companheira de equipe dele usou uma substância proibida e a federação do seu país tentou esconder o fato (até para preservar a presunção de inocência da atleta) ? Não acho certa a atitude de Horton no pódio, mas penso também que, quando ele protesta contar Sun Yang ou a favor do esporte limpo, está falando por si só e não como um porta-voz do seu país ou da Swimming Australia. A hipocrisia só existiria se Mack Horton ele próprio fosse também dopado o que, até onde se saiba, não é o caso.
“A linha tênue de quem sabe e pode tirar a dúvida do atleta e quem ouviu falar, o médico e a nutricionista”
Texto por transcrito do editorial com grifos (aspas) meus, a saber:
“…Porém, minha opinião, ou a sua sobre a minha opinião, não valem nada. O que determina e regula o doping e suas infrações são os Paineis de Doping, as regras, os controles.”
Pelo que soube, por notícias da imprensa aberta é que, ao que parece o melhor nadador do Peru, nas provas do nado borboleta, novamente foi pego em testes de doping e não sabe se explicar.
Sobre o tema Doping não é mais possível ficar inerte em relação a responsabilidade objetiva (“Strict Liability Rule”/Princípio da Responsabilidade Objetiva) dos atletas sobre a questão do doping, o qual deriva a “Common Law”, e determina uma responsabilidade objetiva, independente de dolo(intenção) ou culpa. Ou seja, se a substância proibida for constatada o atleta responderá pelo fato, não importando como ela foi parar em seu organismo.
Vimos muitos casos de tropeços, pequenos vacilos que custaram caro para os atletas, suas famílias, clubes, carreiras, além dos patrocinadores e investidores que, por tabela, também saem prejudicados, sem falar nos danos ao esporte como um todo. No recente caso aqui no Brasil, acredito termos ficados profundamente chateado ao saber que um grande atleta de alta performace do revezamento 4x100m, conforme julgamento das autoridades internacionais esportivas decretaram a pena, também pelo tropeço na negligência. Até quando iremos conviver com isso?
Sob a ótica da razão, questiona-se o porquê de o atleta não ter perguntado à nutricionista esportiva e/ou ao médico, pois estes profissionais sim têm a obrigação de saber e os orientar. E quais são as responsabilidades dos atletas?
Teoricamente é difícil imaginarmos que um atleta de alto nível se arrisque ao uso do doping deliberadamente com todos os filtros existentes, considerando o que está envolvido, e as equipes multidisciplinares profissionais e acompanhamento adequado. Entretanto, em todo este universo, no meu entendimento, ele, e só ele, é o maior e mais importante elo entre a imperícia, a negligência e a imprudência. A responsabilidade sim é do próprio atleta que deve zelar pelas substâncias que ingere, pelos tratamentos que faz e pela sua saúde como um todo.
É por tudo envolvido e por todos os atletas a nível de seleções de seus países, que anualmente WADA publica um guia, e nele estão descritas suas responsabilidades, o regulamento antidoping, dentre muitas outras orientações. Aqui no Brasil, a própria CBDA pode ser consultada a qualquer momento, bem como a ABCD, os clubes, além de nutricionistas esportivos e médicos.
A partir de 2015, as regras mudaram, e, mesmo assim, parece que alguns não entenderam a mensagem dos que apregoam o ” Play True/Jogo Limpo”.
Deixo registrado que não estou julgando nínguém, nem nada, apenas emitindo o que penso sobre o cumprimento da “Regra do Jogo Limpo”.
Concordo com o Julian Romero quando se posiciona de maneira muito clara:
“…Ninguém enfia goela abaixo o suplemento no atleta, foi uma escolha e decisão dele próprio”.
“Porém, minha opinião, ou a sua sobre a minha opinião, não valem nada. O que determina e regula o doping e suas infrações são os Paineis de Doping, as regras, os controles.”
…
FAQ ABCD:
2) O que acontece se um atleta apresenta um Resultado Analítico Adverso por ingerir um suplemento?
O atleta terá que responder por esse resultado. É irrelevante a forma como a substância entrou no organismo. Embora a comprovação da contaminação do suplemento alimentar possa servir como eventual atenuante, o atleta é sempre o único responsável pelo que ingerir.
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Se o problema sempre é o mistério de como a substância foi parar no organismo, por que então eles não páram de tomar o bendito “suplemento”?
Por que insistem em continuar tomando suplementos?
Porque senão não tem como vencer? Porque todo mundo toma e eu estou em desvantagem se não tomar também?
Ninguém enfia goela abaixo o suplemento no atleta, foi uma escolha e decisão dele próprio.
Há uma infinidade de informações disponíveis na internet. O atleta de alto nível é privilegiado com acesso a consultas médicas de Confederações e do COB, além da ABCD ou até mesmo a WADA.
Mas às vezes peca em manter o seu paradeiro atualizado, de acordo com a regra da WADA. Muitas vezes prefere curtir e viralizar no Instagram.
Tem que assumir a responsabilidade e parar de sempre jogar a culpa no outro, na empresa, no suplemento.