Embora ele tenha respondido a repórter da NBC que “não é o fim de sua carreira”, todos nós sabemos que é. Aos 36 anos de idade, o sonho de Ryan Lochte em chegar a sua quinta Olimpíada não se concretizou. Nos 200 livre, ele parou nas eliminatórias, nos 200 medley, terminou em sétimo lugar na Seletiva Olímpica Americana.

Se conseguisse a vaga, Lochte faria história, pois seria o homem mais velho de toda a história dos Estados Unidos a fazer parte da equipe de natação olímpica. Não deu.

É uma pena que toda vez que se fale em Ryan Lochte a gente tenha de se lembrar do “Lochtegate” no Rio 2016, ou suas respostas bobas nas entrevistas e atitudes infantis que se alternaram durante toda a sua carreira.

Lochte foi um dos melhores da história e isso é incontestável.

Se contabilizarmos medalhas, são 12 em Jogos Olímpicos, 27 em Campeonatos Mundiais e Longa, 38 em Mundiais de Curta, 12 em Pan Pacífico e uma em Jogos Pan Americanos. Se você somar a isso sua carreira universitária, de sete títulos individuais do NCAA, os inúmeros recordes batidos afirmo sem pestanejar: Lochte foi o maior nadador de piscina curta (25 jardas ou metros) da história!

E este “título”, não é só pelos resultados ou recordes, mas pela sua qualidade de sua técnica, capacidade em transferência dos movimentos submersos para o início de nado, íncrível habilidade de não perder velocidade em fundamentos primorosos.

Tive a oportunidade de conhecer Ryan Lochte ainda na juventude. Era um bom nadador, apenas isso, um bom nadador. Lembro que em 2002, no Campeonato Americano disputado aqui em Fort Lauderdale foram apuradas várias seleções americanas. Eram, pela ordem, as equipes do Mundial de Barcelona, das Universiades de Daegu e os Jogos Pan Americanos de Santo Domingo, todos seriam no ano seguinte, em 2003.

Lochte ficou na final B dos 200 livre e lá pelo 12o ou 13o lugar ganhou uma vaga no time para o Pan onde nadaria apenas a prova do revezamento 4×200 livre. A vaga havia sido conquistada depois de algumas semanas de training camp feitas na Universidade da Flórida onde ele começaria a estudar em agosto de 2002.

No ano seguinte, um ano sob o trabalho de Gregg Troy, Lochte já era outro nadador. No Pan de Santo Domingo, por algum motivo, permitiram os nadadores fazerem tomadas de tempo nas provas em que não estavam inscritos. Lochte fez o melhor tempo das eliminatórias dos 200 e 400 medley, mas só pode nadar mesmo o revezamento de ouro do 4×200 livre.

Na Flórida, o crescimento de Lochte seguiu, agora de forma geométrica. Em 2004, ele estava no time olímpico e na sua estreia em Atenas era ouro no 4×200 livre e prata nos 200 medley. Lochte não era mais um bom nadador, agora era um nadador espetacular.
Os títulos e grandes resultados vieram ano a ano, nunca pararam. Como também Lochte nunca conseguiu se separar do personagem que ele mesmo criou. Sua personalidade alegre, divertida, também tinha os rompantes de irresponsabilidade. Muitos!

Lochte está entre os nadadores que mais ganharam dinheiro neste esporte, mas não foi só a perda dos patrocinadores em 2016 que atrapalhou sua saúde financeira. Lochte sempre gostou de festas, de estar rodeado de “amigos”. Quem mora em Gainesville, onde ele morou (e mora) a maior parte de sua vida deve ter escutado falar nas “rodadas free”.

Em plena festa, num night club, não foram poucas as vezes que o DJ parava a música para anunciar uma “rodada free” para todos ali presentes pagas por Lochte.

O Lochte “festeiro” é um dos poucos nadadores que entrou no jet set americano. É amigo de celebridades, frequentou algumas das baladas mais nobres da América e é querido por todos.

Este perfil nos faz pensar que Lochte e sua coleção de tênis coloridos, aquele grill que ele colocava na boca, seja uma pessoa arrogante, exibida, metida. Não é! Lochte talvez seja, entre todos os grandes nadadores americanos, o mais aberto, mais receptivo, mais carinhoso.

Uma vez, a revista Sports Illustrated, Lochte contou (sem dizer o nome) que na Seletiva Olímpica de 1992, quando ele tinha 7 anos de idade, subiu um elevador junto com um nadador olímpico e este se recusou a lhe dar autógrafo. Lochte passou a carreira toda dando horas, isso mesmo, horas de autógrafos para os seus fãs.

Não foram poucas crianças que ganharam medalhas de Lochte. Isso desde as mais simples medalhas dos Regionais, aos Campeonatos Americanos e até de Mundiais, Lochte sempre achou que este tipo de ato iria inspirar, fazer jovens atletas gostarem mais do esporte que ele tanto ama. Era divertido!

Em 2019, no meio da maior crise da sua carreira, fora de forma e cumprindo suspensão por tomar infusão de vitaminas, punido por uma foto no Instagram, Lochte diirigiu por algumas horas até Coral Springs, no sul da Flórida.

Ficou sensibilizado pela tragédia do tiroteiro na Stoneman Douglas High School incluindo a morte de um jovem nadador, Nicholas Dworet. Lochte foi até lá para treinar um dia com a equipe e mostrar seus sentimentos pela enorme perda.

No ano passado, um documentário descreveu esta fase de Lochte. Descreve o 2016, o episódio do posto de gasolina lhe custou mais de 2 milhões de dólares em perda de patrocinadores. A sua recuperação inlcuindo a passagem por um centro de reabilitação contro o abuso do álcool e o início de sua família é apresentado em detalhes.

A melhor mensagem do documentário era de que a vaga olímpica para Tóquio seria uma resposta, uma oportunidade a mais de mostrar sua resiliência e o quanto Lochte havia sofrido, mas aprendido com o episódio.

Como tudo em sua vida, Lochte se divertiiu em criar uma história em plena Olimpíada. O seu personagem lhe traiu. Criou uma crise internacional que virou um caso de polícia e onde, até hoje, ele responde de forma criminal.

Uma brincadeira, como as medalhas que joga, as horas de autógrafos, a distribuição de drinks, o personagem Lochte lhe custou caro.

Ao perder a oportunidade de estar em Tóquio, Lochte não terá a chance de recuperação com a equipe americana, com seus companheiros de treino, seus treinadores, nem mesmo com a comunidade esportiva, que ele mesmo chama de família.

Mas assim como termina o documentário de Lochte, neste período tão difícil, ele conquistou suas maiores glórias, a esposa Kayla Rae Red, e o casal de filhos Caiden Zane e Liv Rae. Não há maior troféu do que seguir sua vida perto de sua família.

E como ele falou a repórter da NBC ao perder a vaga olímpica, ele ficará envolvido neste esporte, enquanto estiver se divertindo. Assim é Ryan Lochte, que tanto fez pela natação e nos divertiu por tanto tempo.

Jeah!

Por Alex Pussieldi, editor chefe Best Swimming

5 respostas
  1. Cássio Rosse
    Cássio Rosse says:

    Excelente texto, coach. Parabéns!
    Sempre comentei que se Michael Phelps nunca tivesse nadado, Lotche teria sido o maior nadador de toda história. Fico feliz em saber que contribuiu tanto com o esporte, inspirando tantos jovens. Por um infurtunio, esse personagem criado sempre o comprometeu dentro e fora d’água. Ainda assim, são 12 medalhas olímpicas e 27 em mundiais, uma carreira incontestável!

  2. José Amado
    José Amado says:

    Subscrevo, sem dúvida, o título do artigo. De facto, o Ryan Lochte e o Michael Phelps deram uma enorme projeção à natação. Infelizmente, na minha modesta opinião, pelo menos na europa, nota-se um certo declínio em prol de outros desportos, a julgar pelo desinvestimento das televisões, mesmo especializadas, em campeonatos de natação.

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