Por Plínio Rocha

Terminada a seletiva olímpica, que pode ter definido a equipe brasileira de natação que disputará os Jogos de Tóquio, valem aqui dez pitacos.

PS: está escrito “pode ter definido” porque, como se sabe, haverá uma repescagem para cinco nadadores, em 12 de junho. Na opinião deste, no entanto, dificilmente algum deles conseguirá vaga no time. Quem mais tem chances é Viviane Jungblut, nos 800m e 1500m livre. Mas a parada vai ser dura.

Aos dez pontos, pois.

1. Apenas sete nadadores que também estiveram na Olimpíada do Rio, em 2016, estarão no Japão: Ana Marcela Cunha, Bruno Fratus, Gabriel Santos, Guilherme Guido, Leonardo de Deus, Luiz Altamir Mello e Marcelo Chierighini. De um total de 18 atletas classificados, é de se comemorar uma certa renovação, então? Sim e não. É evidente que é bom adicionar novos nomes a uma equipe, ano a ano, mas, potencialmente, é um grupo que tem menos chances de conquistar medalhas. Claro que ninguém ganha nem perde nada de véspera, mas, quando se para para analisar as possibilidades, não são tantas assim. Pelo que se viu, além de Ana Marcela Cunha, a melhor atleta da natação brasileira na atualidade, Fratus é quem pinta com chance de pódio, nos 50m livre. Se pintar mais algum, é surpresa.

2. “O que acontece com a natação feminina?”, foi uma pergunta que ouvi quatro vezes, de pessoas próximas. O questionamento se explica porque essa equipe terá apenas três meninas. Além de Ana Marcela, a dupla dos 1500m livre, Beatriz Dizotti e Betina Lorscheitter – e vale lembrar que uma das vagas seria de Ana Marcela, mas ela abriu mão, para focar nas águas abertas; mérito para Betina, que havia feito o índice. A questão com a natação feminina passa por muitas coisas, na verdade. Mas o ponto principal é que falta volume no Brasil. Enquanto o número de nadadoras nos grandes eventos não aumentar, a qualidade não vai aumentar. Dá para citar mais algumas coisas, como questões culturais, mas que se fique por aí.

3. Guilherme Costa sobrou na seletiva. Foi, de longe, o melhor nadador. Índices individuais em três provas: 400m (3min45s85), 800m (7min50s41) e 1500m livre (14min59s21). Vai, claro, ter vida duríssima em todas elas no Japão. Mas saiu da piscina do Maria Lenk quase sempre com a sensação de que poderia ter feito tempos melhores. Agora, sem a pressão da classificação e o gás que uma vaga olímpica traz para um garoto de 22 anos, vai brigar contra ele mesmo por marcas e posições melhores. O Cachorrão está com fome.

4. Muita gente reclamou da seletiva. Do formato, das condições do tempo, do fato de ser uma única tentativa para os atletas. Muita coisa faz parte do jogo. Para outras, existe certa coerência. Choveu em alguns dias, inclusive, durante as provas. Atrapalha? Sim, atrapalha. Mas paciência. É assim que foi, todo mundo sabia. Não adianta muito comparar com outros países, como Estados Unidos e Austrália, porque os contextos são diferentes.

5. Muita gente teve dificuldade para baixar tempo, apesar de muitos terem melhorado suas marcas. Mas é compreensível. Seria no mínimo desumano ignorar que as condições trazidas pela pandemia atrapalharam demais os atletas nesse ciclo. Primeiramente, por terem estendido em um ano a preparação, o que causa um impacto significativo. Depois, porque, devido às restrições, muitos ficaram sem treinar ou sem treinar como deveriam e gostariam, pelo menos. Não tem como não dizer que isso não reflete no momento final, o da tomada de tempo oficial. Mas, mais uma vez, não havia muito que poderia ter sido feito em relação a isso. No fim, foi igual para todos.

6. Alguns medalhões e veteranos ficaram fora da equipe. Ainda existem alguns revezamentos brigando por vagas, em condições tão confusas que só mesmo o coach Alex Pussieldi consegue explicar (clique aqui e entenda), mas gente como Etiene Medeiros, Larissa Oliveira, Nicholas Santos e Felipe França estão nessa lista. No entanto, um deles sentiu demais: Brandonn Almeida. Quando falhou na tentativa de se classificar nos 200m e 400m medley, ele estava inconsolável. Tentando, de todas as maneiras, encontrar justificativas. Com a convicção de que, se tivesse mais uma chance, teria sucesso. Triste. Assim, claro, como todos os que tinham a expectativa de classificação, mas não conseguiram.

7. Notícia mais lamentável da seletiva: o doping de André Calvelo. Havia feito 48s15 nos 100m livre e, um dia depois, veio a informação de que havia sido flagrado em um exame. E, mais uma vez, o Brasil tem um nadador com esse tipo de problema. Bruno Fratus não aguentou e detonou a situação, nas redes sociais. Disse que não aguenta mais ver esse tipo de notícia todo ano na natação brasileira. Ele tem razão. Passou do aceitável, já. Calvelo pode até tentar se defender, mas será mais um visto com desconfiança, daqui para a frente.

8. Outra prova que reúne expectativas, pelo potencial que tem e pelo histórico de sucesso no Brasil, é o 4 x 100m livre masculino. Mas não ver ninguém nadando na casa dos 47 segundos foi meio que um balde de água fria. OK, existem as condições adversas, expostas acima. É verdade. Mas será que elas foram tão determinantes assim? Com americanos bem, russos voltando a ter boas performances, assim como alguns franceses, Kyle Chalmers bem na Austrália, até mesmo os britânicos Duncan Scott e Matt Richards com resultados interessantes… O Brasil deverá estar na final, mas terá de se superar bem para pensar em pódio. Pelo cenário atual, parece complicado.

9. Ao que consta, a organização foi bem demais nos protocolos sanitários de segurança. Atletas testados, todos usando máscara, pontos de álcool gel espalhados. Distâncias respeitadas, quando precisavam e podiam ser. Controle de pessoas que poderiam ter acesso ao Complexo Aquático Maria Lenk. Diante do caos que o país vive e toda a preocupação que a pandemia traz, é uma grande notícia.

10. O sonho olímpico sobrevive. Quando o mundo foi atingido pela pior pandemia da Era Moderna, ninguém mais sabia como a vida continuaria. Continuam sendo tantas incertezas que o adiamento dos Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2020, foi uma notícia duríssima, mas necessária. A situação não está mais confortável, hoje em dia, mas se existem maneiras de se realizar o evento, tomando todo cuidado possível e, infelizmente, limitando demais o número de pessoas envolvidas, que bom. Seria uma pancada ainda mais dura para milhares de esportistas, espalhados pelo mundo, que tinham o sonho de disputar uma Olimpíada. Pode parecer egoísta e bobo, pensando apenas nessa parcela da população, mas, com responsabilidade, que os caminhos sejam percorridos e esses sonhos, realizados.

Plínio Rocha é jornalista e escreve a coluna “Na Raia” no Best Swimming desde 2007.

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